LEI Nº 8105 DE 20 SETEMBRO 2018

LEI Nº 8105 DE 20 DE SETEMBRO DE 2018

O IPN é pioneiro na realização de passeios mediados no Circuito.

CRIA O CIRCUITO HISTÓRICO E ARQUEOLÓGICO DA PEQUENA ÁFRICA E INCENTIVA A CRIAÇÃO DE CIRCUITOS QUE ABRANJAM OS CAMINHOS DA DIÁSPORA AFRICANA PELO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º – Cria o Circuito Histórico e Arqueológico da Pequena África, abrangendo áreas da Região Portuária e Centro Histórico do Município do Rio de Janeiro e demais caminhos da Diáspora Africana pelo Estado.

Parágrafo Único – O circuito contempla áreas, espaços, paisagens, personagens históricos, roteiros e qualquer outro elemento que retrate a cultura de matriz africana e dos afrodescendentes presentes, ou ainda a serem identificados, no âmbito da Região Portuária, Centro Histórico da Cidade do Rio Janeiro, ilhas e demais áreas identificadas no
recôncavo da Baía da Guanabara e interior do Estado do Rio de Janeiro.

Art. 2º – No âmbito da cidade do Rio de Janeiro, ficam criados os circuitos e, incentivados por esta Lei, os locais e áreas da Região Portuária e Centro Histórico do Rio de Janeiro delimitados conforme os Anexos I e II.

Art. 3º – O circuito no interior da Baía da Guanabara abrangerá as ilhas que no passado serviram de área de quarentena e de depósitos de cativos africanos, a saber: Ilha de Bom Jesus, hoje ligada à ilha do Governador (Fundão) e Ilha das Enxadas (sob administração da Marinha do Brasil).

Art. 4º – O circuito poderá ser ampliado para os demais municípios no entorno da Baía da Guanabara, através da instalação de sinalização gráfica vertical indicativa das rotas internas da Diáspora Africana, abrangendo antigos portos, mercados de escravos, cemitérios, igrejas, irmandades, áreas das antigas propriedades rurais, vilarejos e demais logradouros identificados como ponto de chegada e dispersão da população africana e seus descendentes no período da escravidão africana no Brasil.

Art. 5º – Os quilombos e áreas doadas a famílias ou grupos remanescentes de ex-cativos serão incluídos no circuito, recebendo, do Poder Público estadual, a devida atenção para instalação de sinalização gráfica vertical indicativa, além do apoio para o desenvolvimento de atividades educacionais e culturais que enalteçam as tradições socioculturais ligadas à valorização da cultura afrobrasileira e de matriz africana.

Art. 6º – Toda e qualquer atividade no circuito terá caráter científico, educacional, social, econômico e turístico.
§ 1º – Todas as ações serão pautadas para a denúncia da violência cometida contra os africanos e seus descendentes durante o período que vigorou a escravidão africana no Brasil.
§ 2º – As ações promovidas por essa Lei deverão servir como atos de reflexão e valorização da cultura trazida do continente africano para o Brasil e das suas vertentes aqui desenvolvidas no âmbito do processo sociocultural da diáspora africana.

Art. 7º – Fica autorizado que o Estado do Rio de Janeiro, através do seu órgão de gestão do patrimônio – INEPAC -, possa fazer o cadastro dos pontos do circuito e facilitar o acesso de pesquisadores, além de incentivar a publicação de teses, dissertações e monografias que tratem do circuito, mediante convênio com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro – FAPERJ.

Art. 8º – Pesquisas arqueológicas, históricas e de demais áreas do conhecimento que tratem da questão da Diáspora Africana terão incentivo do Estado do Rio de Janeiro, mediante editais e programas de valorização do conhecimento, através de programas da pasta da Ciência e Tecnologia.

Art. 9º – As atividades a serem desenvolvidas entre as áreas de abrangência do circuito serão estipuladas por um “Grupo de Trabalho Curatorial” do “Projeto Museológico a céu aberto” do Circuito Histórico e Arqueológico da Pequena África, abrangendo a Região Portuária, Centro histórico do Rio de Janeiro e demais áreas no Estado do Rio de Janeiro.
§ 1º – O grupo de trabalho terá o objetivo de estabelecer conteúdo, recorte conceitual histórico-cultural, abrangência inicial do circuito e a delimitação territorial do museu no âmbito do Estado do Rio de Janeiro.
§ 2º – O grupo de trabalho deverá ser constituído por membros fixos e convidados.
§ 3º – Serão membros fixos do grupo de trabalho:
I – Secretaria de Estado de Cultura (Presidente do grupo de trabalho);
II – Instituto Estadual do Patrimônio Cultural – INEPAC;
III – Conselho Estadual dos Direitos do Negro – CEDINE;
IV – Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos – SEDHMI;
V – Companhia de Estado de Turismo do Rio de Janeiro – TurisRio;
VI – Representantes da sociedade civil que desenvolvem trabalhos e projetos na cultura, patrimônio e memória afrobrasileira da região portuária e do Centro Histórico da Cidade do Rio de Janeiro, Região Metropolitana, Região das Baixadas Litorâneas, Região Serrana, Região Norte, Região Noroeste, Região Médio Paraíba, Região Centro Sul e Região Costa Verde;
VII – Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
§ 4º – Poderão ser convidados membros com relevante conhecimento na área.
§ 5º – Os membros convidados poderão ser substituídos a pedido ou por incompatibilidade com o cronograma dos trabalhos, sendo os novos nomes indicados por consenso dos membros fixos, e ratificado pelo coordenador do Grupo de Trabalho.
§ 6º – O Grupo de Trabalho poderá convidar técnicos e especialistas para auxiliarem no desenvolvimento dos trabalhos.

Art. 10 – Esta Lei entrará em vigor da data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 20 de setembro de 2018

LUIZ FERNANDO DE SOUZA
Governador
Projeto de Lei nº 4054 – A/18

Autoria dos Deputados: Wanderson Nogueira e Waldeck Carneiro

ANEXO I

Inclui os seguintes espaços vinculados à História, Arqueologia e à cultura afro-brasileira na região do Centro Histórico da Cidade do Rio de Janeiro:

Centro Histórico
I – Alfândega (casa França – Brasil) – No prédio da antiga alfândega, as arqueações de cativos africanos eram desembarcadas para o pagamento de impostos (bens de raiz -10% do valor da carga). O processo de descarga de cativos africanos na Alfândega foi registrado pictórica e textualmente por Joan Mouriz Rugendas (1817 -1818). Até o fim do tráfico legal de cativos africanos para a cidade do Rio de Janeiro, toda carga de africanos que entrava pelo porto do Rio de Janeiro, independente de destinação, necessitou de desembaraço alfandegário. Da alfândega, os cativos eram encaminhados para Lazaretos, mercados e leilões na cidade do Rio de Janeiro ou fora dela. Do pátio da alfândega, cargas de cativos africanos foram encaminhados para o Mercado do Valongo e, de lá, já em carga fracionada, para os municípios do recôncavo da Baia da Guanabara. Pelos rios e estradas do recôncavo da Baía da Guanabara, foram interiorizados milhares de cativos escravizados para as propriedades rurais do interior da Província do Rio de Janeiro e para as demais regiões do Brasil.
II – Igreja da Candelária – De acordo com o relato do Reverendo Walsh (1824), os cativos que não chegaram batizados do continente africano recebiam esse sacramento na frente da Igreja da Candelária. Igreja essa que fica de frente para o prédio da antiga Alfândega da Cidade do Rio de Janeiro.
III – Igreja de Santa Rita de Cássia (incluindo o Largo de Santa Rita em frente à igreja) – Na Frente da Igreja de Santa Rita, funcionou, no século XVIII, o primeiro cemitério dos Pretos Novos, funcionando ali até a transferência do mercado de escravos da antiga Rua Direita (Rua Primeiro de Março) para o bairro do Valongo.
IV – Igrejas e Irmandades de Negros – As Igrejas e irmandades de negros ainda preservadas são, ainda hoje, locais de História e resistência do povo africano e seus descendentes. As igrejas de São Elesbão e Santa Ephigência, Igreja e confraria de Nossa Senhora da Lampadosa e a Imperial Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, localizadas no polígono entre a Av Presidente Vargas, Rua Uruguaiana e Av Passos, são o que restou das antigas irmandades de africanos na cidade do Rio de Janeiro.
– Imperial Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos ( Rua Uruguaiana nº77 , Centro, Rio de Janeiro);
– Igreja de São Elesbão e Santa Ephigênia (Rua da Alfândega nº 219, Centro, Rio de Janeiro);
– Igreja e confraria de N. Senhora da Lampadosa (Av. Passos nº13, Centro, Rio de Janeiro);
V – Museu do Negro (Anexo à Imperial Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos) – No museu, estão reunidos documentos, obras sacras, instrumentos de suplício, arte africana, artefatos doados à irmandade de clubes abolicionistas e acervos diversos, que contam a trajetória dos cativos africanos escravizados na Cidade do Rio de Janeiro.
VI – Igreja de São Gonçalo Garcia e São Jorge – Destinada inicialmente como igreja para pardos e mulatos, a invocação de São Gonçalo Garcia recebeu a devoção de São Jorge ainda no século XIX, em função do desabamento da igreja que reunia a corporação de ofício dos ferreiros na Cidade do Rio de janeiro dedicada ao mártir da Capadócia (Turquia) São Jorge. Atualmente, a igreja recebe milhares de fiéis, que congregam a fé e o sincretismo no santo católico São Jorge e no orixá da Umbanda e do Candomblé Ogum. Ruas da Alfândega, Quitanda e Rosário – As vias citadas eram a área destinada ao ofício de ganho realizados pelos cativos africanos que vendiam quitutes, sucos, além dos serviços de sangradores e barbeiros.

ANEXO II

Inclui os seguintes espaços vinculados à História, Arqueologia e à cultura afro-brasileira da Antiga Região Portuária da Cidade do Rio de Janeiro:

Zona Portuária
VII – Largo São Francisco da Prainha – No local, funcionava o Trapiche São Francisco da Prainha, Senzala do Pe. Mota, Casas de Zungus (Angu à Baiana), Mercado dos Pretos Minas. Atualmente, encontra-se instalada a estátua da bailarina Mercedes Batista, (Mercedes Ignácia da Silva Krieger foi bailarina e coreógrafa negra, considerada a maior precursora do Balé e da Dança Afro no Brasil. Nasceu no ano de 1921 em Campos dos Goytacazes, RJ).
VIII – Morro da Conceição e o Quilombo da Pedra do Sal (Quilombo Pedra do Sal – AQPEDRA, – Área Especial de Interesse Cultural, Memória do Samba). Local de luta e resistência do povo negro pelo direito à moradia, à arte, religião, participação política e liberdade cultural.
– Pedra do Sal (Atual Largo João da Baia). A Pedra do Sal foi um dos primeiros espaços ligados à herança cultural popular e negra no Brasil, reconhecidos como patrimônio cultural, sendo o primeiro no Rio de Janeiro e no Sudeste. No local, grandes nomes do samba como Donga, João da Baiana e Pixinguinha costumavam se reunir. A pedra também foi o berço do samba urbano carioca, dos ranchos e blocos de carnaval. O mar batia onde fica a Pedra do Sal, lugar onde a população negra, que tinha vindo da Bahia, se reunia para ver os navios e receber os amigos e parentes. Ali começou o rancho. Havia um terreiro de candomblé: a pedra era usada para despacho. Então, era um local de reunião e encontros de Tias e sambistas influentes e estende a toda a comunidade heterogênea que se forma nos bairros em torno do cais do porto.
IX – Conjunto arquitetônico do Cais do Valongo ,Cais da Imperatriz e Praça Municipal (atual Praça Jornal do Comércio).
– Cais do Valongo Patrimônio Cultural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O local marca o ponto central de venda e comércio de africanos escravizados no antigo bairro do Valongo. Localizado na antiga Enseada do Valonguinho, o cais, mandado construir pelo Intendente Geral de Polícia da Corte nas primeiras décadas do século XIX, marcou o epicentro do comércio negreiro nas primeiras décadas do século XIX, até o tráfico de escravos ter sido considerado ilegal na década de 30 do século XIX. A presença do complexo representa a existência de trapiches que existiam ao longo das praias do Valongo e do Valonguinho, que faziam parte de um complexo mercadológico, que pode ser considerado como o maior mercado de carne humana do século XVIII e XIX das América e quiçá do mundo. Em 1838 -1843, já fora do período de legalidade do tráfico de escravos, um novo cais foi construído e, posteriormente, ampliado nas proximidades do antigo cais do intendente de polícia para recepcionar a terceira Imperatriz do Brasil D. Thereza Cristina no ano de 1843.
X – Edifício Docas Pedro II – Fundado em 1871, o armazém Docas Pedro II é atualmente considerado um marco na história do País e da luta do movimento negro. Construído pelo engenheiro negro André Rebouças como o primeiro armazém do Porto do Rio para guardar grãos trazidos pelos navios que atracavam no local, nenhum escravo
trabalhou no projeto, coisa rara à época.
XI – Remanescente da casa de nascimento de Machado de Assis – Na Ladeira do Livramento, na Antiga Chácara do Livramento, Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839 e cresceu nas ladeiras do Morro do Livramento. Filho de um pintor de parede negro e de uma bordadeira açoriana branca, poderia ter tido
uma trajetória comum a muitos garotos pobres, mestiços e moradores de favelas. Diferentemente do prognóstico pessimista, ele foi um dos maiores escritores do Brasil. A despeito da epilepsia, da gagueira e de uma doença congênita nos olhos, o autor de “Dom Casmurro” e “Memórias póstumas de Brás Cubas”, entre tantos clássicos, tornou-se um gênio.
XII – Jardins Suspensos do Valongo. Criado pela reforma do Prefeito Pereira Passos, foi construído, em uma encosta do Morro da Conceição, inicialmente como obras de contenção. É uma construção paisagística situada na encosta oeste do Morro da Conceição, no trecho que também já foi chamado de Morro do Valongo, no bairro da Saúde, na cidade do Rio de Janeiro, no Brasil. Foi projetado pelo arquiteto-paisagista Luis Rey e construído em 1906 como parte de um muro de contenção, durante as obras promovidas pelo prefeito Pereira Passos. Está a 7 metros acima do nível da rua e possui 1 530 metros quadrados de área. Concebido como um jardim romântico, destinado ao passeio da sociedade nos finais de tarde, ele continha terraço, passeios, arborização, combustores de gás, depósito de água para irrigação, canteiros e grama, jardim rústico, casa do guarda e depósito de ferramentas e até mesmo uma cascata. O acesso pode ser feito até hoje por escadas pela Rua Camerino. Haviam, no jardim, quatro estátuas em mármore, representando divindades romanas: Minerva, Mercúrio, Ceres e Marte. Estas estátuas foram retiradas do Cais da Imperatriz de Grandjean de Montigny, localizado próximo e que, à época, encontrava-se em ruínas. No nível da atual Rua Camerino, existiam diversas edificações utilizadas no antigo mercado de escravos que foram arrasadas para o alargamento da via. Atualmente, nas proximidades do Jardins, estão localizadas as sedes do Afoxé Filhos de Gandhi do Rio de Janeiro, Centro Cultural Pequena África e do Espaço de Memória Casa da Tia Ciata. Hilária Batista da Silva, conhecida como Tia Ciata, foi uma das responsáveis pelo desenvolvimento e consolidação do Samba no Brasil. Cozinheira e mãe de santo, nascida na Bahia, é uma das figuras mais influentes da cultura negra carioca do início do século XX. Realizava encontros entre os músicos e religiosos filhos de santo e, nessas seções, a música dava o tom. Uma exposição permanente sobre a veterana do samba é a principal atração do espaço, além, é claro, conhecer a Bisneta de Tia Ciata, a querida Gracy Moreira.
XIII – Largo do Depósito. O local abrigava armazéns de “negociantes de grosso trato” e mercadores de escravos que controlavam o tráfico negreiro.
XIV – Rua Barão de São Felix. Local que se concentravam antigas e pioneiras Casas de Santo como a de João de Alabá onde Tia Ciata fora iniciada. No local, também existiu a Sociedade Islâmica, diversos Cortiços. Sobre a Casa de Santo de João de Alabá sabe-se que o terreiro foi fundado por Bangboshê Obitikô, por volta de 1886, no tempo do Candomblé da Barroquinha em Salvador. Bangboshê retornou à Bahia e entregou a casa a João Alabá, que era de Omolu, para continuar a tradição. A Iyá kekerê (mãe pequena) era Hilária Batista de Almeida, Omo Oxum (filha de oxum), conhecida por Tia Ciata. Provavelmente, essa foi a primeira casa de candomblé na cidade do Rio de Janeiro. Oba Saniya fundou seu terreiro também no mesmo bairro. Alguns anos depois, o (Balé Xangô) Oba Saniya e Bangboshê retornam para a Bahia, e Mãe Aninha viria pela primeira vez ao Rio de Janeiro. Chegando no Rio, encontrou a casa de Oba Saniya abandonada e resolveu cuidar e colocar a casa em ordem; nesse período, iniciou algumas iyawôs com a ajuda das Tias baianas que já moravam no Rio. Seguindo os passos de Oba Saniya e Bomboxe, Mãe Aninha (Iya Oba Biyi) faria inúmeras viagens da Bahia para o Rio de Janeiro. Oba Saniya e Bamboxe, que também possuíam o titulo de Balé Xango, estiveram no Rio de Janeiro por volta de 1886 e se instalaram no bairro da Saúde, implantando o axé de suas respectivas casas. Sobre a sociedade muçulmana situada na antiga Rua da Princesa (atual Rua Barão de São Félix), é citada pelos cronistas João do Rio (Paulo Barreto), em seu livro Religiões do Rio, e por Gastão Cruls, em A Aparência do Rio de Janeiro. Nessas obras, existem várias referências a respeito da presença de muçulmanos vindos da África, alguns deles importantes líderes religiosos, residentes na Rua Barão de São Félix. Gastão Cruls chega a fazer referência às orações da sexta-feira (salatul jummúa), uma prática islâmica, que aconteciam numa antiga sociedade beneficente árabe existente nessa mesma rua desde o século XVIII. Na mesma rua, conforme João Cruvello Cavalcanti, em sua obra “Nova Numeração dos Prédios da Cidade do Rio de Janeiro”, havia também, no número 16, a sede da Sociedade da União Beneficente Protetora dos Cocheiros, atividade de grande importância naquela época.
XV – Praça da Harmonia e Adjacências – (Mercado Municipal) O local, onde hoje fica a praça, situava-se o Mercado da Harmonia, criado para atrair parte da excessiva demanda do Mercado Municipal da Praça XV. O mercado, devido à sua baixa movimentação, foi se transformando, progressivamente, em um grande cortiço. Em 1897, o local foi desapropriado para ser transformado em trapiche e entreposto. Entretanto, a região continuou invadida, tendo protagonizada uma epidemia de peste bubônica em 1900. O prédio que havia no local foi arruinado devido a um incêndio. Durante a Revolta da Vacina, os restos do velho mercado foram utilizados como trincheira de vanguarda. Muito material foi retirado do local, principalmente pedras de cantaria, para a formação de barricadas em ruas próximas. Após o fim da revolta, com o objetivo de eliminar qualquer lembrança dos acontecimentos na cidade, o prefeito Pereira Passos reurbanizou totalmente a área, ordenando a construção da Praça da Harmonia no local do antigo mercado. Local da Revolta da Vacina – (Horácio José da Silva) Mais conhecido como Prata Preta, era um capoeirista e estivador brasileiro, morador da cidade do Rio de Janeiro. É considerado, por muitos, um símbolo de luta contra o governo durante a Revolta da Vacina, em 1904. Liderou mais de 2 mil pessoas na barricada do bairro da Saúde (que fora apelidada de Porto Arthur ( esquinas da Rua Antonio Lage e Rua Sacadura Cabral – Praça da Harmonia, em alusão à fortaleza russa) contra o exército, constando que chegou a matar um soldado durante um dos ataques. Foi preso quando a cidadela improvisada caiu, e deportado para o Acre. Em 2004, quando a Revolta da Vacina completou 100 anos, um grupo de amigos do bairro da Saúde criou a Associação Carnavalesca e Cultural Cordão do Prata Preta, com o objetivo de reconstruir a memória desse acontecimento e prestar homenagem ao capoeira. O Cordão do Prata Preta desfila no sábado de carnaval pelas ruas e ladeiras do bairro da Saúde/Gamboa. Rua Antonio Lage com Av. Rodrigues Alves. Sobre o prédio onde funcionou a Companhia Nacional de Navegação Costeira, situado na Rua Antonio Lage com a antiga Av. Rodrigues Alves, existe um artefato em ferro, que simboliza o marco da predominância de africanos e descendentes de africanos, muçulmanos, vindos de várias regiões da África Ocidental, interagindo entre si, apesar da diversidade étnica da época, segundo consta da pesquisa desenvolvida por Haidar Abu Talib a respeito da presença muçulmana no Rio Antigo e em outras regiões do Brasil. Era expressiva grande quantidade de muçulmanos que trabalhavam nas atividades afins de todo o funcionamento portuário de então. Na obra de Paulo Daniel Elias Farah, a tradução de importante fonte primária reconhecida mundialmente que é o relato do imam Al Baghdádi , um dos membros da tripulação do navio Al Bursa da marinha otomano, que desembarcou no Rio de Janeiro no ano de 1866, e que por aqui foi autorizado a permanecer por anos, após constatar o grande de fluxo de africanos e seus descendentes muçulmanos que aqui viviam e trabalhavam.
XVI – Cemitério dos Pretos Novos (Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos – IPN Museu Memorial) – O Cemitério dos Pretos Novos o único cemitério de mercado de escravos das Américas, conhecido até então, identificado como Memorial dos Pretos Novos, O IPN é um sítio arqueológico e centro cultural situado no bairro da Gamboa, na Zona Central da cidade do Rio de Janeiro. Localiza-se nos números 32, 34 e 36 (residência da família Guimarães os quem acharam as ossadas durante as obras da casa e posterior fundadores do IPN) da Rua Pedro Ernesto, em dois casarões do século XIX. O centro fica sobre o local onde funcionou, entre 1769 e 1830, um antigo cemitério de escravos. É administrado pelo Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos fundado em 13 de maio de 2005, nove anos após do achado durante as obras na residência da família Guimarães. Fundar o instituto foi uma forma que amigos e a família Guimarães encontraram para guardar a memória da história dos Pretos Novos. Atualmente, os casarões funcionam como centro cultural, cuja finalidade é resgatar a história da cultura africana na cidade através da divulgação cultural e artística. No local, são oferecidos cursos e oficinas. A Galeria Pretos Novos, situada no centro, onde são apresentadas exposições temporárias de arte contemporânea de temática africana. Já a Biblioteca Pretos Novos, inaugurada em novembro de 2012, conta com cerca de 1200 títulos dedicados à cultura, à história e às artes afro-brasileiras e indígenas. O centro recebeu esse nome por homenagear os Pretos Novos. Pretos Novos era o nome dado aos escravos recém-chegados ao Rio de Janeiro pelos trapiches e Cais do Valongo e que eram negociados no mercado de vendas de cativos africanos e de escravizados Recentemente, Equipe de Arqueólogos encontrou esqueleto de uma mulher em escavação em um dos poços de observação do Instituto de Pesquisa e Memória dos Pretos Novos (IPN). Batizada carinhosamente como Josefina Bakhita em homenagem à primeira santa africana da Igreja Católica, a jovem de aproximadamente 20 anos morta há dois séculos é o primeiro esqueleto encontrado inteiro no sítio arqueológico. Foram sete meses de escavações coordenadas por Reinaldo Tavares, do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em dois metros quadrados no território conhecido como Cemitério dos Pretos Novos. Na atual Rua Pedro Ernesto, escravos recém chegados da África, que não resistiam à viagem, eram jogados. Isso mesmo, jogados. Dispostos em uma pilha de corpos, em seguida eram queimados para evitar a propagação do cheiro dos cadáveres. E, depois, enterrados um em cima do outro. É o que os restos mortais encontrados confirmaram. Segundo a arqueóloga e Professora da UFRJ Dra. Andrea Lessa, além de indícios de carbonização dos ossos, o fato de terem encontrado uma mulher surpreende, já que apenas 9% dos negros trazidos em cativeiro para o Brasil eram do sexo feminino. “Não há padronização na disposição dos corpos. É como um mosaico, indicando que foram colocados ali simultaneamente sem proteção ou separação. Em cima de Bakhita, podemos ver a perna de outra pessoa e mais um crânio, sem qualquer cuidado na hora do sepultamento. Se é que podemos chamar isso de sepultamento”, afirma Lessa. Desde que descobriu o sítio arqueológico em janeiro de 1996, Merced Guimarães, diretora do IPN, luta pela proteção e divulgação da história e do legado dos Pretos Novos.
XVII – Centro Cultural José Bonifácio – O belo palacete em estilo renascentista foi construído em 1877 e, a pedido de D. Pedro II, foi ali inaugurada a Escola José Bonifácio – primeira escola pública do Brasil, que funcionou no local até 1966. Após um período desocupado, passou a ser uma biblioteca regional especializada na temática africana e se transformou em um centro de referência sobre a história e a cultura negra, com a criação do Centro Cultural José Bonifácio. Localizado na região portuária, nas proximidades da Gamboa com a Saúde – área que ficou conhecida como “Pequena África” e onde se encontram sítios arqueológicos – o Centro Cultural foi inaugurado em 1986 e tem como responsabilidade e principal meta incentivar o estudo, a valorização e a divulgação da cultura afrobrasileira, em todos os seus âmbitos.

2 comentários em “LEI Nº 8105 DE 20 SETEMBRO 2018”

  1. Foi um grande prazer poder colocar no papel os anseios da comunidade, dos movimentos sociais e dos setores envolvidos na preservação da memória dos ancestrais afro-brasileiros. Como Historiador e Arqueólogo estou deixando para as futuras gerações ferramentas legais para o incentivo à pesquisa da Arqueologia da Diáspora Africana no Rio de Janeiro. Agradeço ao IPN e aos nobres deputados que acolheram o projeto de lei. Essa luta é de todos nós e dos Pretos Novos, que mesmo estando invisíveis para a sociedade estão presentes na construção de um Brasil melhor.

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